“Saúde! Um pouquinho assim. Respeito! Um pinguinho assim. Liberdade! Um tantinho assim”. Os versos, adaptados da canção “Ensaboa”, de Marisa Monte, entoados pelo grupo da capital mineira “Cigarras cantoras do Vitória” deram o tom do início da I Conferência Estadual de Saúde das Mulheres, com o tema “Saúde da Mulher: Desafios para a Integralidade com Equidade”. As canções apresentadas, exaltando a beleza do cotidiano e a força das mulheres, fizeram vibrar o auditório, que acompanhou com palmas e repetindo os refrões. A integrante do grupo, Dona Teresinha, 79, encerrou o momento. “A gente é alegre e canta para levar alegria a quem nos assiste. Eu ‘tô’ é alegre. Nós não somos de dizer que não aguentamos, nós somos fortes”, exaltando características das mulheres.
O coletivo abriu espaço para a mesa “A situação atual do país e seus impactos na vida das mulheres”, composta pelas palestrantes Maria Alves, conselheira estadual de Saúde, representante de usuárias e usuários pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais e trabalhadora rural, Beatriz Cerqueira, Katia Souto, membro da Comissão Nacional Organizadora e de Relatoria da 2ª Conferência Nacional de Saúde da Mulher, ex-conselheira do Conselho Nacional de Saúde (2014/2016) e ex- conselheira do Conselho Nacional LGBT (2011/2016), e coordenada por Lourdes Machado, secretária-geral no Conselho Estadual de Saúde de Minas Gerais, representando as trabalhadoras e trabalhadores pelo Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais. Lourdes enfatizou a realização do evento como resultado de múltiplos esforços. “Somos 197 municípios, 950 inscritos, dos quais pelo menos 70% são mulheres, conforme nosso regimento. Diante da diversidade que aqui encontramos, o nosso grande desafio reside em como garantir acesso à saúde a todas as mulheres, contemplando suas especificidades”, colocou. Ao fim dos três dias da 1ª CESMu-MG serão compiladas propostas elaboradas durante o evento que deverão ampliar as possibilidades da saúde de atendimento e cuidado, considerando as várias vulnerabilidades a que as mulheres estão expostas e integrar a Política Nacional de Saúde Integral das Mulheres.
A 1ª CESMu-MG se concretiza de diversas formas, como no abraço coletivo incentivado por Maria Alves, da comunidade quilombola de Ouro Verde. “Essa Conferência é marcante para as mulheres mineiras, da cidade e do campo. A nossa organização é primordial, a força das mulheres precisa ser maior do que a força política que quer fazer com que a gente abra mão dos nossos direitos, sonhos e liberdade”, disse. O abraço coletivo é simbólico, expressando afeto, abrigo e cuidado. Mas representa também unidade na luta das mulheres, caminho apontado como saída para o grave contexto de desenvolvimento de um modelo de Estado que não engloba todas e todos, em que um padrão de mulher é colocado. Um padrão estético, comportamental e que restringe o lugar da mulher ao âmbito privado, de acordo com Beatriz Cerqueira. “Atravessamos momento grave, em que não há um projeto que inclua todas nós, onde as mulheres são a maioria entre os desempregados, possuem menores salários e são as primeiras a serem demitidas. Estamos sempre em situação mais precária e vulnerável”, afirmou.
Diante dessa conjuntura acontecerá a II Conferência Nacional de Saúde das Mulheres, em contraposição ao que ocorria durante a 1ª Conferência, época marcada pela redemocratização e construção da Constituição Cidadã, de 1988, segundo Kátia Souto. “Esse espaço é fundamental para realizarmos o debate democrático, a resistência, mas acima de tudo ampliar os direitos e a força das mulheres. Temos o direito de definir como nossos corpos existem e como ter acesso ao trabalho”. E para isso é necessário união e pensamento coletivo. A fim de enfrentar a situação que nos impõe congelamento dos investimentos sociais por 20 anos e as propostas de reforma trabalhista e previdenciária, que atingem especialmente as mulheres. Kátia lembrou Simone de Beauvoir, para quem os direitos das mulheres são os primeiros a serem atacados em momentos de crise política, econômica e religiosa, e recorreu a Graciliano Ramos para apontar a alternativa aos ataques sofridos. “O que a vida quer da gente é coragem. E nós mulheres somos ousadas e corajosas!”, finalizou.
Se as boas-vindas foram dadas com música, o encerramento das palestras não poderia ser de outra forma. Dessa vez, a voz era a do público, que de forma marcante cantou alto “participar sem medo de ser mulher!”.
Por Gabriel Moraes
921 total views, 1 views today