O Conselho Estadual de Saúde de Minas Gerais (CES -MG) reuniu, no dia 10/7, no auditório da Controladoria Geral da União 47 municípios afetados e/ou impactados pela mineração no estado de Minas Gerais para dar início a construção coletiva da Política Estadual de Saúde para Pessoas Atingidas pelos Efeitos da Atividade Minerária. Participaram também 40 instituições do executivo, legislativo e judiciário das três esferas de governo, e movimentos sociais da saúde e representações de pessoas e comunidades atingidas pela mineração. Como proposta inicial foi aprovada a formação de um Grupo de Trabalho (GT) que irá trabalhar nas ações que irão compor a política estadual.
A presidenta do CES-MG, Lourdes Machado, que é moradora de Congonhas município de aproximadamente 54 mil habitantes e que possui a maior barragem urbana da América Latina, a barragem casa de pedra, pondera que onde há mineração, há agravos na saúde e que essa grave situação se torna um problema de saúde pública, disse ainda que pela primeira vez a população participa ativamente da construção de uma política. “Temos duas propostas construídas nas conferências livres que foram levadas para a Conferência Estadual de Saúde, aprovadas e inseridas no Plano Estadual de Saúde e no Planejamento Anual de Saúde. Onde tem mineração não temos segurança da água que bebemos, do ar que respiramos e da terra onde plantamos. Temos que começar a dizer o que precisamos fazer com isso”, argumentou.
A presidenta destacou também questões como o tráfego pesado de caminhões de minério na BR 040 no trecho de Belo Horizonte a Conselheiro Lafaiete, que são responsáveis por grande parte dos acidentes. “Os acidentes provocados pelas carretas de minério impactam na vida e na saúde das pessoas, é necessário que a via do minério saia do papel e se concretize; outra questão importante é a saúde mental das populações atingidas, bem como a medicalização excessiva para cuidar dos sintomas depressivos e ansiosos causados pelo pânico de um rompimento ou pelo sofrimento ocasionado pelos crimes de Mariana e Brumadinho. A expectativa é que esta Plenária seja o início de um grupo de trabalho produtivo para a construção coletiva de uma política Estadual de Saúde para a população atingida pelos efeitos perversos da mineração. ”
A chefe de gabinete da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), Marina Cury, destacou a importância da plenária devido à grande representatividade, neste que é um tema pioneiro justamente por não ter acontecido nada parecido na história do país. “A SES-MG tem tentado algumas ações, mas esse momento tem o objetivo de pensar um plano estruturante para tratar o tema de forma coletiva e vai ser uma iniciativa pioneira não só em Minas Gerais, mas no Brasil”.
O assessor de Parcerias em Saúde da SES-MG, Luiz Fernando Prado de Miranda acrescenta que é preciso ter um olhar para as ações de reparação pensando não apenas no contexto do desastre, mas para um estado que tem uma atividade minerária intensiva como uma das principais atividades econômicas. “Os eventos se tornam agudos quando nas grandes proporções como Mariana e Brumadinho, e em locais em que esses eventos não aconteceram – e esperamos que não aconteçam – mas que têm impactos na saúde da população. Pensando nisso desenvolvemos ações isoladas, mas tentamos articular essas ações para que sejam desenvolvidas de forma estadual e também de forma sistêmica”, relatou.
O coordenador do Núcleo de Ações Reparatórias da SES-MG, Lucas Daniel e importância da iniciativa do Conselho o pensar em um espaço de discussão centralizado, reunindo representações e pessoas que fazem parte da pauta e destaca que todos os momentos de escuta da população foram importantes para a construção de ações existentes, lembrando que ainda existe muito para ser feito e, por isso, é necessário que esse plano seja feito a partir da população.
A Assessora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde o Trabalhador do Ministério da Saúde, Gabriela Reis, disse que na instância federal existem um olhar para a vigilância dos grandes empreendimentos em mesas de diálogos sobre a mineração que reúnem vários 14 ministérios, com o objetivo de pensar os impactos nos territórios minerados. Segundo ela, pode-se usar o exemplo do Vale do Jequitinhonha que enfrenta a chegada de mineradoras de lítio, com a possibilidade de a saúde não estar no debate do licenciamento ambiental. Isso é abrir espaço para a mineração, atividade que mata, mutila e enlouquece. “É preciso pensar em várias frentes de forma transversal. Os desastres nos fazem olhar para essa questão e não queremos fazer a vigilância só de desastres”. Para isso, está sendo implementado um projeto de vigilância popular em saúde, ambiente e trabalho, que será vinculado aos movimentos sociais para dar indicadores mais precisos sobre o assunto.
A coordenadora Regional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde da Macrorregião Sanitária Centro e promotora de Justiça, Vanessa Campolina, disse que a construção da política precisa ter a participação comunitária e o SUS sabe fazer isso. “Essa discussão no conselho que é a casa da participação comunitária e social é muita coisa, não é pouco o que está acontecendo aqui hoje. O Ministério Público entende a importância da construção de uma política para as pessoas atingidas pela mineração. Diante do histórico de rompimento e o impacto, a saúde é o território de maior vulnerabilidade. Precisamos de uma resposta formatada e organizada e essa resposta pode vir por meio dessa política que pode funcionar como um guarda-chuva para o problema, em que são colocados desafios como saúde mental, vigilância o olhar específico da pessoa atingida dentro da política do SUS”.
Legislativo é parte importante do debate
A plenária contou com as presenças da deputada Bella Gonçalves e dos deputados Lucas Lasmar e Leleco Pimentel, que defenderam a criação de políticas estaduais e de que as discussões da plenária serão levadas à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Lucas destacou que é preciso rever o fato de que municípios que estão recebendo recursos dos crimes ambientais estão destinando o dinheiro para o asfalto e não para a saúde, quantia que poderia estar estruturando hospitais filantrópicos, hospitais 100% SUS, investidos em leitos de UTI, neonatal e também em uma política que vá de encontro com a pessoa do campo.
Bella Gonçalves lembrou que os debates estão sendo feitos na ALMG também com a presença de pessoas atingidas, compartilhando dados de estudos como o da Fiocruz sobre a exposição a metais pesados como é o caso do Tijuco, perto de Brumadinho, que tem com 70% das crianças expostas e contaminadas por esses metais.
Leleco Pimentel acrescentou que a discussão tem sido feita também em uma Comissão Interestadual que reúne o legislativo estadual de Minas Gerais e Espírito Santo para discutir sobre a situação do Rio Doce, onde ambos os estados estão buscando meios de melhorar a situação de um rio tão importante e que foi tão afetado pela mineração, admitiu também que mesmo com esses relatórios dando vários caminhos e soluções, o tópico da saúde com relação a atingidos pelas barragens ainda é bem precário e completou sua fala afirmando que historicamente a mineração falha com o setor da saúde desde o século XIX.
O vereador de Belo Horizonte, Bruno Pedralva, destacou que o caminho é pensar a mineração pensando na saúde de forma ampla. “Sabemos que somos todas e todos afetadas/os pela mineração”.
A Comissão de Emergências e Desastres do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG) foi representada por Renata Miranda dizendo que essa política é um avanço para a conquista de direitos pela prevenção e promoção e estamos nos organizando de uma forma saudável para criar uma alternativa.
Participação social
Representações das regiões atingidas foram ouvidas e destacaram na voz de pessoas como Frei Gilvander Moreira e do diretor de Meio Ambiente e Saúde da União das Associações Comunitárias de Congonhas (Unaccon) que é preciso ter um olhar global do que leva as pessoas ao adoecimento. O representante do Movimento de Atingidos pela Mineração (MAM), Marcelo Bruno Ribeiro Barbosa, entregou uma proposta com os 23 pontos levantados por um grupo de trabalho local e disse que os problemas e impactos da mineração vão além das barragens. “É preciso discutir barragens, mas a revisão do modelo de mineração como um todo, com um debate profundo e amplo sobre uma alteração no sistema de mineração no Brasil.
O representante do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Mateus Adriano de Jesus Souza, lembrou que é possível ofertar saúde com qualidade e estimular as pessoas a usarem a sua voz em momentos como esse.
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