O Conselho Estadual de Saúde de Minas Gerais (CES-MG) ampliou as discussões sobe o uso terapêutico da cannabis no SUS, pensado por um viés de possibilidades e desafios. O debate reuniu no dia 11/10/24, no Auditório Vermelho do Ministério Público de Minas Gerais, especialistas, pesquisadores, professores, associações e militantes em uma reunião extraordinária, que ao final provou a preparação de uma resolução do CES-MG e de recomendações para o fomento de pesquisas, educação permanente para profissionais de saúde pesquisa e discussão nos conselhos municipais de Saúde.
A presidenta do CES-MG, Lourdes Machado, explicou que está sendo discutido na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) o Projeto de Lei (PL) 3.274/21, de autoria da deputada estadual Beatriz Cerqueira. O que será discutido na plenária do CES-MG segundo ela são as possibilidades e os desafios da cannabis terapêutica no SUS para que se consiga promover a equidade e integralidade do cuidado para todas as pessoas. “O Artigo 196 da Constituição Federal fala que a Saúde é direito de todos e um dever do estado, então se é dever do estado e o conselho de saúde é um órgão que acompanha as políticas públicas, é nosso papel também, enquanto controle social, dizer que temos que propiciar o mesmo acesso de quem tem dinheiro a quem não tem. A proposta aqui é falar disso no SUS”, afirmou.
Beatriz Cerqueira sublinhou a importância desse posicionamento do CES-MG e do controle social na Saúde como uma força importante. Segundo ela, a votação do projeto de lei será consequência dessa movimentação. “Estamos no processo de buscar convergências e construir no âmbito da ALMG resultados para avançar. A manifestação da sociedade civil é muito importante”.
O psicólogo, socioanalista, especialista em Psicologia Social e Institucional, presidiu o Instituto de Regulamentação e Controle de Cannabis no Uruguai, um dos países que regulamentaram o uso da cannabis, inclusive para fins recreativos, Augusto Vitale Marino, falou sobre a necessidade de construção, não somente um marco legal, mas também uma proposta humanista em que pacientes e suas famílias sejam o centro das respostas. Ele explica que no Uruguai conseguiu avançar por meio de lei. “O presidente Mujica foi muito valente em fazer essa proposta de lei ao parlamento, que depois de uma nova de discussão pública foi aprovada”.
Marino ressaltou a construção que está sendo feita em Minas e avançando em um conceito muito importante que é a acessibilidade. “É preciso evidencias nos pacientes do pais. As evidências de outros países não são para o uso em todos os países. Por isso, temos que compatibilizar as evidencias a nível internacional tantos nas universidades e no conhecimento acadêmico que acompanha os tratamentos e pesquisas para decisões administrativas”.
O conselheiro do Conselho Regional de Psicologia e membro da Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal, Anderson Matos, disse que profissionais de Psicologia entendem que esse tema trata de uma garantia dos direitos humanos e à saúde, além de oportunizar às pessoas tratamentos mais humanos, que oferecem menos efeitos colaterais e qualidade de vida.
Trabalho de pesquisa
O defensor público, coordenador estadual da Pessoa Idosa e da Pessoa com Deficiência (CEPIPED), da Defensoria Pública de Minas Gerais Luís Renato Braga Arêas Pinheiro, enfatizou que a cannabis não pode ser aplicada como última alternativa de tratamento e sim como a primeira. “Falando da minha experiência pessoal, com o meu filho, que tem autismo nível 2 de suporte, isso foi transformador”.
O procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Antônio de Padova Marchi Júnior, disse que esse tema tem que ser discutido por todas as instituições e é um assunto que permeia a todas elas. “É preciso romper aas barreira para as pesquisas da cannabis”.
A professora, diretora de Fomento à Pesquisa da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFMG, Karina Braga destacou a importância da ciência e a necessidade de se conhecer as iniciativas de pesquisas para que sejam aplicadas nos cuidados clínicos de pacientes. A reitora destacou que as portas da universidade estão abertas para ações conjuntas com o CES-MG.
A coordenadora de Farmácia e Terapêutica, representante da Subsecretaria de Acesso a Serviços de Saúde (SUBASS) da Secretaria de Estado de Saúde, Samira do Nascimento Mateus Nunes Lyra, falou sobre questões em que o tema da cannabis esbarra quando o assunto é saúde pública e sociedade. “Estamos atrasados em relação aos avanços da indústria farmacêutica. Isso empobrece o país que compra medicamentos importados. É uma forma de expropriar o país por meio da indústria. São questões profundas e com a cannabis temos que pensar no uso correto dos recursos do estado que devem beneficiar o país.
O vereador de Belo Horizonte, Bruno Pedralva, disse que a defesa da cannabis terapêutica no SUS e é uma questão de garantia do direito ao acesso, porque existem fartas evidências cientificas de benefício como medicamento.
O deputado estadual Leleco Pimentel frisou que é importante que o tema da cannabis conte com o trabalho de informação para abrir a mente das pessoas. “É um assunto contaminado pela hipocrisia”, disse. Ele acrescenta que “não podemos perder a chance com esse projeto da ALMG e sabemos que o debate está acontecendo na Câmara dos Deputados e o CES tem muita responsabilidade na aprovação dessa resolução”.
O médico de Família e Comunidade Terapia Canabinoide da Universidade Federal de São João Del Rei, Hygor Cabral, é um estudioso e atua como um prescritor da cannabis, acompanhando pacientes desde 2019 e destacou a importância do acesso. “Levo isso para dentro da universidade, em uma disciplina que eu ensino o sistema endocanabinoide e as potencialidades da cannabis. Acho que a gente tem que pensar uma política pública que seja ampla e democrática e que não seja restritiva demais. Vimos algumas políticas públicas de outros estados e municípios que restringem tanto para patologias tratadas ou determinam quais médicos que podem prescrever.A Acho que é um tratamento médico como qualquer outro e em muitos casos com resultados mais positivos”, salienta.
Mais acessível
A plenária extraordinária contou com intervenções de pessoa participantes e representantes de associações voltadas ao apoio de paciente. Ingrid, da Associação Flor da Vida e Marcha da Maconha, destacou a necessidade de preparar profissionais de saúde que ainda não entendem como funciona e sugeriu um alinhamento educacional de profissionais de Saúde do SUS junto com as associações.
O vice-presidente da ANGATU, Lucas Candini, contou como o diagnóstico de Alzheimer dos seus avós influenciaram no surgimento dessa Associação que tem como objetivo fomentar a pesquisa, a discussão pública e o conhecimento em relação ao uso medicinal da Cannabis.
A representante Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal (AMA+ME), Junia Cruz, ilustrou a importância do acesso terapêutico da cannabis pelo SUS “Quando você vê pessoas que não andavam com Parkinson e passam a andar, com dificuldade no equilíbrio e passa a ter, com crises epiléticas que estão sem ter. Então, isso é acolher, isso é amor, isso é ser querido na saúde. E a gente precisa que o tratamento seja acessível.
Fotos: Eric Bezerra (MPMG)